Dr. FroiData finalizava a leitura de um artigo super interessante, enquanto esperava um dos seus pacientes mais icônicos: o Sr. IBRAOS (Investidor Brasileiro Old School). Milagrosamente, ele chegou na hora da consulta. Por si só, um feito. Assim, ele começa.
Sr. IBRAOS: Querido Dr. FroiData, estava ansioso por esta nova consulta!
Dr. FroiData: Compartilho desta empolgação, Sr. IBRAOS. Podemos continuar com a nossa última conversa, ou tens algo diferente em mente?
Sr. IBRAOS: Eu tenho. Gostaria de entender que maluquice é essa de Venture Capital (“VC”)?
Dr. FroiData: Que legal! Assunto top.
Sr. IBRAOS: Não sei não. Tem uns empreendedores e empreendedoras, que se chamam de founders por aí, vindo pedir uns investimentos loucos no meu family office, mencionando que é assim que funciona em VC. Eu retruco logo, explicando alguns eventos do meu super histórico no mercado financeiro:
Sou da geração de ouro do Garantia;
Tinha um pedaço da Ágora, quando foi vendida para o Brasdescão;
“Shortiei” as empresas do Eike Batista nas máximas;
Sou amante do CDI;
Financiei a turma do BTG Pactual para recomprar o banco do UBS.
Enfim, eu entendo de Brasil. De tempos em tempos me pergunto se eu sou o Brasil, mas preciso de mais consultas para me abrir com você sobre isso…
Dr. FroiData: Nossa. Realmente deve ser melhor focarmos no tópico VC, antes de abrir essa caixa de pandora. Retomando: o tema é vasto. Algo específico que gostaria de começar?
Sr. IBRAOS: Sim. A narrativa é que a indústria vive de outliers, por isso tem essa estrutura especial de capitalização por estágios, para ir alimentando de capital esses casos únicos. Mas o que seria uma startup outlier no contexto brasileiro?
Dr. FroiData: Belíssima pergunta. Vamos usar alguns dados para ajudar neste debate.
Sr. IBRAOS: Dados? Filhão, aqui é instinto, gut feeling. Você acha que eu tinha dados na época do Garantia? No Brasil, até o passado é incerto!
Dr. FroiData: entendo perfeitamente, Sr. IBRAOS. Décadas de experiências bem sucedidas, com a sorte ao seu lado, sendo canalizadas com suas próprias heurísticas para lidar com decisões complexas. Mas temos que lembrar que se trata de uma nova classe de ativos, mais imatura e mais arriscada, na qual você não tem experiência. Logo, a busca por indícios de uma taxa base de mercado para saber o que esperar me parece fazer sentido.
Sr. IBRAOS: Justo. Mas não tive sorte: 100% do meu resultado é derivado de trabalho duro!
Dr. FroiData: Claro, claro, não teve sorte nenhuma na sua jornada… não entrarei neste assunto agora. Vamos começar pelo começo: qual seria uma definição de um outlier no mercado de VC?
Na minha concepção, deveria ser algo ligado ao resultado operacional em si, inicialmente medido pela geração de receita. Como não temos os dados de todas as empresas tech para fazer a análise, precisamos separar um grupo de empresas bem sucedidas e buscar identificar padrões de geração de receita. Detalhes:
Amostra: vamos pegar a lista de empresas públicas do admirável Dr. Luiz, da Exit In Public, mais dados de algumas empresas privadas do PitchBook;
Vou propor 2 linhas de corte, com os valores em USD do ano de 2022:
o famoso 3D2T (links 1, 2, 3), considerado uma meta de outlier mundial:
Receita anualizada do seed: USD1.4M;
Meta de sucesso para a receita anualizada: USD100M;
Tempo: 5 anos, a partir do seed.
a mediana global atual:
Receita anualizada do seed: USD450k;
Meta de sucesso para a receita anualizada: USD60M;
Tempo: 8 anos, a partir do seed.
Limitações para esse exercício: viés de sobrevivência, não sabemos se essa amostra é representativa, e nem todas seguiram a trilha tradicional de VC como sabemos hoje. Mas, como sempre digo, estamos buscando mais a direção no momento, para irmos trazendo mais precisão com a constante evolução do mercado, além da maior captura de dados.
Agora vamos aos gráficos!
Sr. IBRAOS: “Agora vamos aos gráficos…” - fazendo uma voz de criança, claramente desmerecendo o outro locutor.
Dr. FroiData: Já conversamos sobre esse tipo de comportamento infantil não ajudar em debates de nenhuma espécie.
Sr. IBRAOS: Desculpas…
Dr. FroiData: Ok. Seguindo com os gráficos:
Comentários:
Temos 2 empresas que bateram o mitológico 3D2T: Stone e Nubank. Então podemos afirmar: é possível!
Podemos ver uma certa densidade por volta dos níveis da mediana global para as empresas da nova geração (décadas 2000-2020);
As empresas do grupo “Vintage Tech”, que desbravaram o mercado e hoje são as consolidadoras, tiveram um caminho mais longo para atingir os faturamentos esperados do contexto atual. Visualmente, por volta dos vinte anos após a fundação para chegar nos USD50M de receita anualizada;
Dos dados privados que agrego aqui no consultório, a maior parte dos casos de sucesso estão no grupo das medianas globais. Inclusive os de grandes saídas de investimentos;
Conclusão: me parece razoável esperar que uma startup no Brasil seja considerada um outlier se estiver batendo (ou perto) das medianas globais de faturamento.
Sr. IBRAOS: Queridão, isso aqui é muito difícil. Não temos um ambiente empreendedor, custo Brasil impera, faltam recursos de todos os tipos (humano, capital, cultural etc), somos consideravelmente menores em termos econômicos do que as grandes nações inovadoras do mundo. Tendo a concordar realmente que já é uma tarefa hercúlea para qualquer empresa de tecnologia no Brasil pensar em bater as medianas globais…
Dr. FroiData: Acredito que sim, Sr. IBRAOS. Adicionaria que estamos aprendendo rapidamente com os casos de sucesso do mundo, replicando playbooks e modelos de negócios, mas a nossa realidade é dura mesmo. Indo além, se derivarmos essa linha de raciocínio, poderíamos estimar uma linha de performance para as startups que buscam funding de VC com essa premissa:
Logo, se alguma startup estiver batendo esses dados de receita acima descritos, acho que vale você investir um pouco mais de tempo da sua equipe de análise para se aprofundar nos detalhes. Sabendo que um negócio não é somente sua geração de receita, também tem que estudar para entender melhor sobre aquisição, engajamento e unit economics, além de todos os aspectos qualitativos (time, processos, governança).
Sr. IBRAOS: Claro! Depois de tudo, direcionar os loucos e loucas o suficiente a empreender no Brasil para continuar sonhando grande!
Dr. FroiData: Os sonhos geralmente são grandes, mas a diferença virá da capacidade de execução ao longo do tempo, transformando a visão em valor. Para isso, founders precisam de direcionamento, incluindo as metas por rodadas, seguindo o mantra: startup outlier no Brasil é aquela que bate as medianas globais!
Sr. IBRAOS: Curti!
Dr. FroiData: Fico feliz em ajudar.
Sr. IBRAOS: Boa. Tenho que ir para a próxima reunião. Agora vamos ao pagamento. Sobre isso: pensou naquela minha proposta de te pagar em 90 dias?
Dr. FroiData: Lembra que te expliquei que não era legal se financiar em cima de fornecedores e prestadores de serviço em geral, na segunda consulta?
Sr. IBRAOS: É verdade. Old habits die hard. Como sou “antenado”, vou pagar no pix!
Muito bom, Cassio! Essa é uma discussão que a gente tem tido. Muito bom ver os dados e a sua análise.
Excelente!!!
Você consegue compartilhar os dados dos gráficos para eu conseguir visualizar melhor e estudar empresa por empresa? (estou tendo dificuldades com o esquema de cores 🤫)